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Um Advogado que Escuta: Reflexões para um Mundo Conectado




A advocacia sempre foi uma profissão marcada pela técnica, pela formalidade e pelo compromisso ético. No entanto, em tempos de transformação digital e comunicação imediata, é fácil cair na armadilha de enxergar o advogado como um mero executor de tarefas ou solucionador de problemas. Nesse contexto, a reflexão proposta por Theotonio Freitas em seu recente post sobre a "profissão da empatia" ressoa profundamente.

Freitas destaca que, na essência, o exercício do Direito vai além de dominar a técnica jurídica ou usar a tecnologia de forma eficiente. A advocacia é, antes de tudo, sobre pessoas. E a conexão com elas começa com algo tão simples — e tão raro — quanto saber escutar.

Em tempos de alta tecnologia e comunicação instantânea, a empatia e o cuidado genuíno se tornam ferramentas revolucionárias. Como costumo dizer, "a coisa mais disruptiva que existe é o cuidado".

No entanto, vivemos o que Byung-Chul Han chama de “sociedade do desempenho”. Não são mais os corpos que são explorados, mas as mentes — sempre pressionadas por produtividade, conectividade e resultados imediatos. Na advocacia, isso se reflete na crescente uberização da profissão: advogados reduzidos a fornecedores de soluções rápidas, com valor medido pela velocidade de entrega, e não pela profundidade da análise ou pela qualidade do atendimento.

Essa lógica transforma o advogado em um "produto" no mercado, desconectando-o de sua essência. A busca incessante pela perfeição, polidez e eficiência extrema esvazia o que há de mais humano na profissão: a capacidade de escutar e compreender o outro.

No campo jurídico, entretanto, essa exigência traz consequências adversas: as soluções criadas sem a base de uma escuta atenta e da compreensão holística da situação muitas vezes produzem soluções que não abarcam os problemas em toda sua complexidade.

Byung-Chul Han nos alerta que, nessa sociedade hiperprodutiva, o excesso de comunicação e visibilidade estreita o horizonte da experiência. Na advocacia, essa hiperconectividade pode levar à superficialidade das relações — tanto com clientes quanto com colegas de profissão. O advogado que escuta, por outro lado, rompe com esse ciclo, oferecendo um espaço de acolhimento e reflexão que se torna, mais terapêutico: verdadeiramente útil.

Quantas vezes vemos questões jurídicas sendo tratadas apenas no âmbito técnico, sem que a dor, o contexto e as nuances do cliente sejam verdadeiramente considerados? O advogado que escuta é aquele que compreende que cada história tem camadas. Não é só sobre interpretar leis, mas sobre interpretar pessoas: suas expectativas, seus medos e seus sonhos.

Como bem pontuou Freitas, “as posições de destaque serão ocupadas por aqueles com maior capacidade de entender e se relacionar com o outro”. Isso porque a empatia não pode ser automatizada, nem substituída por algoritmos ou assistentes digitais. É ela que diferencia o advogado excelente do mediano.


Então, para nós, advogados, a lição é clara: escutar é a base de uma advocacia transformadora. Não uma escuta automática, mas uma escuta real, genuína e profunda — aquela que capta o não dito e transforma dados em significado.


O futuro da advocacia não está em correr contra o tempo, mas em oferecer o que mais falta no mundo atual: cuidado, profundidade e humanidade.


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